domingo, 31 de janeiro de 2010

I. CARTA DE AMOR (variante)

a Jorge S. Braga


Um destes dias
vou-te matar
Uma tarde avançada onde estejas (costumeiro)
a mugir urtigas
no jardim da Estrela
um tiro de canhão
Não te vou permitir sequer desembainhar a corneta
Podes invocar Armstrong, Miles, Marsalis
todos os clarins de sabão
ninguém virá em tua defesa
Adiado finalmente o anseio de estrelato
Bye Bye Blackbird, diria Poe
Um destes dias vou-te matar...
Uma certeira bala de esperma
mesmo no olho (do cu)

H. SUIL

Mal entrava em casa abria
uma garrafa de leite

frio e estendia-se nua
no sofá. De vez em quando

deixava que algumas gotas
lhe escorressem dos lábios

e lhe fossem perlar os pêlos
do púbis negros como azeviche

in O poeta nu, Ed. Assírio & Alvim, 1997

G. O artista

suas mãos tingidas, voláteis,
mascando a tarde
o corpo semi-nu, semi-deus,
fixando um ponto
no contaponto de Bach
viaja: viaja sempre
com o avião na garganta
em primeira
vendeu ontem um sistema mole,
um caracol atravessando a estrada:
o risco é a sua exposição
não bebe, asceta de pele alva
camisa em pano preto amarrotada,
botões soltos: como embarcações
à deriva no mar

O Artista fez um pedido ao ministério,
com ar sério: mistério.

F. Rarefeito

O ar laminado daquela tarde,
comprimido no vácuo da bomba
montada no peito,
ladeada pelas botijas dos pulmões
de ferro rarefeitos.

Entrou-lhe um animal na respiração,
que se aninhou junto ao detonador
acariciando a cavilha com as patas,
uma carícia velada de dor.

O sol no zénite penetra a fresta
do sexo quando o animal espreita
as cidades eleitas e ataca sereno,
o sol é cálido e o sangue cálice.

Este mundo de flores campestres
que transporto na memória,
vive embriagado de noite,
nos caules apodrecidos do poema.

E. À Katine Walmrath

Irmã poesia,
entre nós corre lento
o rio Atlântico.

tu com tua loucura Tropicália.
eu com minha loucura Europália.

E vejo esse rio entre nós
tão calmo
que nas suas águas
os reflexos de tuas mãos
pareço ver.

Estreitando as margens
do imenso mar,
um abraço de águas
eu te quero dar.

(escrito em caldas da rainha, terra de águas sulfúreas, janeiro de 2010)

D. (sem título)

Eu fui um louco que viveu cem anos
Compondo um gigantesco manuscrito...
Madrugadas profundas de proscrito
Gastei sobre o papel dos meus enganos.

Memórias de delírios mais insanos,
Razões petrificadas de algum grito,
Anotei, registrei, pus por escrito
Na chama congelada dos meus planos.

Quando enfim fui chegando junto à morte
Vi que tudo escrevera, e ri da sorte,
Que as páginas tocavam já nas sancas.

Foi aí que enxerguei, oh! distinta!
Que nunca na caneta houvera tinta,
E a morte entre um milhão de folhas brancas.

Alexei Bueno

in Poesia Brasileira do Sec. XX; selecção, introdução e notas Jorge Henrique Bastos, Ed. Antígona, Fevereiro de 2002

C. Fishtail



Chama-se Fishtail Clothing e foi criada por dois amigos do 11º ano que queriam vestir algo diferente e criado por eles...

Ainda estão no início, mas contam com a ajuda de todos para que possam chegar ao mercado internacional.

O relato de quando tudo começou foi feito por um dos mentores da ideia, Diogo Afonso, no espaço do www.forum.pt dedicado à Comunidade FORUM, em http://www.forum.pt/comunidade-forum/groups/viewgroup/36-Fishtail+Clothing.

"Eu e o meu amigo decidimos criar uma roupa de marca nacional, e começamos a tratar de tudo, como arranjar recibos para vender em lojas, fazer modelos, arranjar uma empresa de estampagem e tentamos divulgar ao máximo a marca, mas ainda nos falta muito para sermos uma marca de roupa conhecida."

A FORUM quis saber um pouco mais sobre este assunto e descobriu mais algumas coisas sobre a Fishtail Clothing:

- A ideia surgiu num dia de verão, Agosto de 2009, pela cabeça de Diogo Afonso. "Estava na hora de almoço do meu trabalho de Verão e pensei em criar uma marca de roupa, pois gostava de usar algo criado por mim. Em termos dos visitantes no nosso site, o ritmo das encomendas está mais ou menos - em Outubro passado tivemos 15 encomendas e agora temos 5 encomendas feitas."

O site destes dois alunos (Diogo Afonso, de 17 anos, e João Pedro, de 16 anos) da Escola Secundária Dr. Augusto Cesar da Silva Ferreira (Rio Maior) é http://www.wix.com/fishtailclothing/Clothing. Aqui podem ver os catálogos, modelos, estilos e tamanhos que existem.... Inclusivamente podem encomendar a vossa peça de roupa preferida!

B. recuerdos del sur (Praia da Rocha, Algarve)


28.01.10-13.03.10
Praia da Rocha

6 discos-postais de 45 rotações da Praia da Rocha (1919-1971), 18X18 cm. Capas PVC, 19,5X19,5 cm. Masterização: José Moz Carrapa/2009.

«6 postais da Praia da Rocha em Portimão que vão de 1919 a 1971 lidos por Davide Balula, Inês Vasques, José Sandoval, Laurence Perrillat, Inês Amado & Pedro Viana e Sílvia das Fadas em 2009. As leituras foram gravadas. As gravações foram masterizadas por José Moz Carrapa e depois impressas em disco de vinil 45 rotações a 1 exemplar cada.»

Plataforma Revolver (Lisboa/Portugal)

A. (até quando escreverei aranhas nos teus olhos apagados?)

sentado na nudez da praia
queimo uma a uma as cartas
que te escrevi, como amor
de fogo, extingo a noite

o corpo exangue flutua
sobre a areia mole
alguns pássaros sonâmbulos
rodopiam sob a lua
como índios em rito de guerra
nos meus ombros
que se afundam nas areias

uma noite tão metálica
que a sua lâmina corta
o olhar
em dois hemisférios:
olhos de sal

desse amor florestal
restam destroços eucaliptais
na terra árida
queimada pelas tuas mãos
onde outrora cultivávamos
campos de suor

Beijo-te;
uma pétala solitária
extingue o fogo do peito:
até quando escreverei aranhas
nos teus olhos apagados?

RECOMEÇOS

Recomeçar ("Shaker loops", John Adams). Ciclos que se fecham, outros que se abrem. Recomeçar significa escrever de novo, repensar, reimprimir sensações, redefinir objectivos, rever metas, trocar caminhos, encontros reencontros num novo trajecto, previsivelmente diverso, não necessariamente melhor ou pior que os anteriores. Recomeçar sempre, partindo dum improvável risco no asfalto, imaginário por vezes, quase sempre dum zero conjunto vazio impossível de verificar. As paisagens fecharam o ciclo anterior e fica a certeza da escrita volátil, num espaço e num tempo impresso no lapso amarrotado do papel ou fluindo directo ao ecrã. O tempo da absoluta liberdade acabou, mas nestes recantos incertos da palavra gosto de pensar que tudo será possível dizer, e tudo ouvir(sem filtros pueris), sem a ameaça latente da mordaça.

(escrito num sábado do fim de janeiro de 2010, nas caldas da rainha)