domingo, 30 de maio de 2010

Hoje no Cistermúsica - 3º e 4º Andamento do 4º Quarteto de Cordas Op. 36 de Béla Bartok

O XVIII Cistermúsica inicia-se hoje em Alcobaça



O festival Cistermúsica 2010 arranca este domingo, 30 de Maio, com o concerto do Cuarteto Casals na Sala do Capítulo do Mosteiro de Alcobaça. Este ano, o festival debruça-se até 31 de Julho sobre as ligações entre música e literatura.

PROGRAMA

Dia 30 de Maio - Concerto de Abertura
18h – Mosteiro de Alcobaça, Sala do Capítulo
Cuarteto Casals (Espanha)
3 euros

Dia 5 de Junho
21h30 – Igreja de Nossa Sra. Dos Prazeres, Aljubarrota
Nuno Inácio e Stephanie Manzo

Dia 6 de Junho
18h – Celeiro do Mosteiro de Alcobaça
Lusio Voice
5 euros

Dia 11 de Junho
21h30 – Igreja Paroquial Santo André, Cela
Adriana Ferreira e Trio de Cordas
3 euros

Dia 12 de Junho
21h30 – Igreja Matriz de Évora de Alcobaça
Adriana Ferreira e Trio de Cordas
3 euros

Dia 13 de Junho
18h – Mosteiro de Alcobaça, Sacristia
L’Angelica
8 euros

Dia 19 de Junho
21h30 – Cine-Teatro de Alcobaça
Orquestra do Algarve
Entre 5 e 8 euros

Dia 20 de Junho
18h – Cine-Teatro de Alcobaça
Trevor Wye (Inglaterra)
5 euros

Dia 26 de Junho
21h30 – Cine-Teatro de Alcobaça
“Contos Dançados de 3 países”, pela CeDeDe

Dia 27 de Junho
18h – Centro Cultural Gonçalves Sapinho, Benedita
“Tubax”
5 euros

Dia 3 de Julho
21h30 – Mosteiro de Alcobaça, Sacristia
Cláudio Marcotulli (Itália)
5 euros

Dia 4 de Julho
18h – Convento de Coz
“A Imagem da Melancolia”
5 euros

Dia 9 de Julho
21h30 – Mosteiro de Alcobaça, Claustro D. Dinis
London Brass Tentet (Inglaterra)
Entre 5 e 8 euros

Dia 22 de Julho
21h30 – Mosteiro de Alcobaça, Sala do Capítulo
Sonor Ensemble (Espanha)
5 euros

Dia 23 de Julho
21h30 – Igreja Matriz de S. Martinho do Porto
Quinteto À-Vent-Garde
3 euros

Dia 24 de Julho
18h – Igreja de Nossa Sra. Da Ajuda, Vestiaria
Quinteto À-Vent-Garde
3 euros

Dia 30 de Julho
22h – Mosteiro de Alcobaça, Claustro D. Dinis
Jue Wang (China)
Entre 8 e 45 euros

Dia 31 de Julho – Concerto de encerramento
21h30 – Cine-Teatro de Alcobaça
Orquestra Metropolitana de Lisboa

sexta-feira, 28 de maio de 2010

!!!

CENA 15

quando o coração manchado
a tinta de esmalte
pulou a um ritmo incerto
galgou o passeio
como qualquer peão.

quando deu entrada no hospício
não tirou os olhos do decote
da enfermeira
na enfermaria

escutava compulsivamente
free-jazz
e balbuciava palavras sem sentido:
kerouac, baudelaire, ezra...

mais tarde foi-lhe diagnosticado
um poemário no cérebro

um dia resolveu ser incendiário,
a partir dessa altura anda sempre
com uma árvore dentro do bolso.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Manhã muda

sem palavras, eu e tu e o silêncio,
os versos mudos,
desfeitos,
como pó,
nos passos,
traços na manhã muda
o vértice do corpo deslizando
o sangue vibrante nas carótidas
o sol oblíquo caminha a meu lado
na sombra
no ritmo
no passo apressado,
como eterno desconhecido,
e sempre as palavras na ausência delas:
em vez da ausência.
o sangue circular das palavras.(

ESCRITOR

galgar passeios era o seu passatempo preferido
no sono da contramão
o escritor é um tipo perigoso, um camaleão
depois os copos, sempre os copos
e a vida errante engarrafada

o que o salva são as massas de água
e os cornos enfiados na papelada
avaliação ambiental,
perequação compensatória
leitos de cheia até aos joelhos
o litoral afogado, o afogamento faseado,
na rua de Camões atolado em poesia
e pólens pendurados nas orelhas.

terça-feira, 25 de maio de 2010

sábado, 22 de maio de 2010

A bela do bairro


Ela era muito bonita e benza-a Deus
muito puta que era sempre à espera
dos pagantes à janela do rés-do-chão
mas eu teso e pior que isso néscio desses amores
tenho o quê? quinze anos
tenho o quê uns olhos com que a vejo
que se debruçava mostrando os peitos
que a amei como se ama unicamente
uma vez um colo branco e até as jóias
que ela punha eram luzentes semelhando estrelas
eu bato o passeio à hora certa e amo-a
de cabelo solto e tudo não parece
senão o céu afinal um pechisbeque


ainda agora as minhas narinas fremem
turva-se o coração desmantelado
amando-a amei-a tanto e sem vergonha
oh pecar assim de jaquetão sport e um cigarro
nos queixos a admiração que eu fazia
entre a malta não é para esquecer nem lá ao fundo
como então puxo as abas da farpela
lentamente caminho para ela
a chuva cai miúda
e benza-a Deus que bonita e que puta
e que desvelos a gente
gastava em frente do amor


Poema de Fernando Assis Pacheco

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Uma dedicatória à jovem escritora

A Ceia está pronta (Supper's ready)

(...3:42...)

Algo inevitável está a acontecer
Regressas cada vez mais tarde
quando a noite adere às paredes
essa noite que me passeia
nos ombros de mansinho, regressas
com mãos que te percorrem
o pescoço em busca do ar,
as ruas lá fora pararam
meu amor, um lenço esvoaça
num movimento líquido
de sangue derramado.
Nunca mais voltas esta noite.

terça-feira, 18 de maio de 2010

CENA 3

Jack no centro da cidade,
empilhando caixas de whisky
contando os dias na parede
escrevendo versos
com as últimas gotas de sangue.

Viajamos com o indispensável:
caneta, papel, o pó dos dias,
um fato para o bailado final.
Mais um copo, até deixar
de sentir os contornos da noite,
manchas de carvão nos dedos.
Uma cama redonda
de sangue virginal,
arredondar a manhã
nos teus mamilos.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

OUTONAIS

A tua pele tem rugas, na geologia dos vulcões,
no centro e daí emana uma lama espessa
na completa geografia do tempo holográfico
um diccionário para a concavidade
da noite com pássaros no ciclo das estações
a lâmina rasante na suspensão do ar por um trevo
folheadas as páginas das tuas mãos sobre as minhas

o teu corpo só o teu
a boca na boca breve
uma coxa na revelação
da luz incendiando
os viajantes
a língua desenha
um meridiano quando
despes a palavra.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

SEGURANÇA SOCIAL

A vertigem da palavra
os labirintos da fala
a grande travessia desértica
com corpos de chumbo disparado
ilhas e tal como ilhas
a desolação da água no horizonte
um livro aquece o centro
com a humidade reentrante da pele
placa informativa:
abrigo climatizado para almas
perdidas.
Uma nova guerra nuclear.

OS TRÊS MAL AMADOS

Joaquim:

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.


As falas do personagem Joaquim foram extraídas da poesia "Os Três Mal-Amados", constante do livro "João Cabral de Melo Neto - Obras Completas", Editora Nova Aguilar S.A. - Rio de Janeiro, 1994, pág.59.

João Cabral de Melo Neto

terça-feira, 11 de maio de 2010

(...)

Quando escavas, perdes a noção do tempo
curvado sobre ti, sobre o teu silêncio
cada vez a escavação é mais profunda
e vão surgindo brilhos,
as unhas preenchidas de terra
e vermes enxutos
de uma secura planetária.
Com a ponta da navalha extrais a terra
incrustada nas unhas e julgas
inevitável a cicatriz do ar

redondo verso de cicuta
árido e alvo
na espessura da morte
quando o poço transborda
na queimadura da água

sábado, 8 de maio de 2010

NEAL AND JACK AND ME




Neal and Jack and Me

I'm wheels, I am moving wheels
I am a 1952 studebaker coupe
I'm wheels, I am moving wheels moving wheels
I am a 1952 starlite coupe...
En route.....les Souterrains
Des visions du Cody...Sartori a Paris...
Strange spaghetti in this solemn city...
There's a postcard we're all seen before...
Past wild-haired teens in dark clothing
With hands-full of autographed napkins we
eat apples in vans with sandwiches ... rush
Into the lobby life of hurry up and wait
Hurry up and wait for all the odd-shaped keys
Which lead to new soap and envelopes...
Hotel room homesickness on a fresh blue bed
And the longest-ever phone call home.....no
Sleep no sleep no sleep no sleep and no mad
Video machine to eat time... a cityscene
I can't explain, the Seine alone at 4am
The Seine alone at 4a.m....Neal and Jack and me
Absent lovers, absent lovers...


"Beat", in "Beat", King Crimson, 1982

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Carla

Tributo às Fábulas incompletas e ao seu autor José Luís

sempre desejei escrever um soneto simples com letras de água
catorze versos alinhados da forma habitual numa folha branca
em que as palavras mais não fossem que ondas desalinhadas
e as frases pudessem evocar as imagens náuticas que em mim


se repetem todas as noites. deitado ao teu lado não adormeço
sem içar uma âncora, mesmo quando sei que sonhas um mar
por nós nunca dantes navegado. ouço a tua respiração suave
e sei que em ti se aporta a ilhas encantadas, em ti não morre


nunca a promessa do aroma da canela. se te navegasse podia
descobrir que afinal não estou preso a um cais e libertar-me
das amarras de sal nos meus pulsos de marinheiro que sinto


ao olhar a mansidão do teu corpo feito caravela ancorada a nós:
por que razão continuamos encalhados nesta maresia só nossa
se sabemos ambos que a maré apenas sobe quando a noite desce?


in blogue Fábulas incompletas Aqui

quarta-feira, 5 de maio de 2010

(sem palavras)

Ferragudo

"O rio alarga no seu estuário, recortado pelos arcos metálicos pujantes, da ponte ferroviária que o cruza de nascente para poente, ambiente esse traduzido pelas palavras dum poeta:

Hoje sentei-me na moldura do arade,
e vi a massa aquosa que deslizava
como um espelho ondulado


E é aqui, nesta geografia de águas largas que tudo se passa a partir de 1969

Voltando a Ferragudo, haveria de habitar com meus pais e irmãos uma casa à entrada do povoado piscatório, debruçada sobre um braço do Arade que me oferecia o cenário de Janela indiscreta sobre a povoação, assente na base do rio, com a ponte rude e rasteira de arcos quadrangulares como o largo que que se anuncia no fim da descida. O cais e a beira-rio com os barcos de pesca, montando a partir daí, uma profusão de escadarias, rampas e ruas íngremes que culminarão no topo do casario, na Igreja Matriz, debruçada sobre o estuário do Arade, observando a fortaleza de Santa Catarina, na margem oposta do rio.

Deste lugar dominante a vista inicia a sua navegação oceânica de largos horizontes.
É pois esta imagem nostálgica de uma povoação compacta, bem estruturada nas ruas e rampas, subindo sempre com paredes alvas, um casario cúbico como uma pintura de Maluda..."

terça-feira, 4 de maio de 2010

Arte poética

Há poemas que não digo,
que não escrevo em vão,
há palavras nas telas,
na pintura de versos,
a carvão.

COM OS OUVIDOS POSTOS EM VALADO DE FRADES



quando a alma vagabunda despe-se prostituta
inebriada num balanço nocturno
quando as cordas cortam o frio
e posam nuas na margem
um vapor rasga a vidraça
café negro cais abandonado,
mais um copo de gelo afogado.

NACIONALISMO

Existe um papagaio na varanda da frente
que assobia o hino nacional.

CONDIÇÃO HUMANA

Convidei a vizinha para tomar um copo,
nunca mais me falou.