terça-feira, 28 de setembro de 2010
Quase poema
Explodes nas têmporas como sangue
no rugido do animal nocturno,
constelação de palavras feridas,
no torniquete tenso da linguagem.
Adormeces entre duas linhas negras,
num espaço de sombra entre palavras,
desenhando muros altos entre viagens.
Da madrugada ascende uma maré
de luz,
ascendes como livro inacabado e insone,
recitativo, o tempo enche-se de pássaros,
de mãos pousadas sobre a espuma,
tecendo ondas debruçadas sobre o areal.
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Disperso nº 1
e nada acontece
neste ecrã escuro.
Só eu me escrevo de nudez
e os outros escrevem-me
cartas brancas
duma alvura significante.
Às vezes gostava de pintar
violetas no céu e parar
o tráfego aéreo.
terça-feira, 14 de setembro de 2010
SEI
da incompleta gare do tempo
em prelúdios de sombra,
os ramos muito quietos
reflectidos no lago profundo.
Eu que nunca parto
passos de pedra breve,
gotejando, alma desabrigada,
um fim de linha metálico.
E se um grito surdo ecoar
no muro do poema,
Sei que partirei envolto
na neblina dos espelhos
Sei que partirei agora
com a voz grave do baixo contínuo
devolvendo à terra o corpo
original.
sábado, 11 de setembro de 2010
RETRATO DO ARTISTA
Irra, que queriam formatar-me normal,
pintar-me os lábios côr de vinho,
rasgar-me no centro do peito o coração.
Embalar-me numa caixa dura,
com as obras completas,
e um laço no Natal, bem forte,
não fora a suspensão do corpo,
ceder na cervical.
Poesia a norte
o Peloponeso pinta-me o pénis Laurinda
Aqui
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
QUANDO PASSEAVAS
há quanto tempo passaste?
e agora parado, o sol a pino
passas por mim cabelo solto
só, de mãos dadas ao vento
as sombras correndo loucas
girando em torno das copas
ramos e folhas em uníssono
E eu tão imóvel a tudo ver desfilar
o movimento perpétuo da galáxia
dos teus olhos, no sangue morno
quando te passeava na minha vida
VERSINHOS A UMA AMIGA FINLANDESA
que é feito da tua bizarria
continuas bela como na fotografia?
eu quando penso em ti ainda tenho
dentro do pobre coração torcaz
aquele bicho a roer devagarinho
tu eras só pen pal mas tanto faz
mais sede não se tem dum pucarinho
não te perdoo que ficasses por lá
em Likkolampi casando com um qualquer
como pudeste ó Anna ser tão má?
yours sincerely já te chamava mulher
mais tarde eu fiz catorze anos
o amor era no meu peito como um lenho
quereis saber críticos vós fulanos?
inda me arrepia esta dama de antanho
in Variações em Sousa, Fernando Assis Pacheco, 1987
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
(...)
Luís Miguel Nava, Vulcão, Lisboa, Quetzal, 1994, p.63
domingo, 5 de setembro de 2010
(...)
musas de peito pétreo
e uma boca de sémen
cálido, o mastro erecto
navegações e portos
seguros, por uma vez
une autre biére,
antes do urinol alvo:
falhado.
Os marinheiros são
uns porcos, dizia-me
uma vez uma gaivota
cagam no mar alto
são loucos, isso sim
corre-lhes a maré
nos vasos sanguíneos
up and down, à beira
do enjoo matinal
bairro alto de novo
cais do sodré talvez
mais um copo pra
ver melhor o mundo
sem fundo
sábado, 4 de setembro de 2010
sexta-feira, 3 de setembro de 2010
Outro poema de amor
empoleirado
nos seios
de areia recosto
lanço cotovelos
ao mar
tocando o lábio da onda
regressando à duna
estendo a toalha
olho o olhar
a tarde cortada
meia laranja solar
creme no lombo
o pézinho dela
a pulseira pendendo
no fim da época
balnear
Meurglys III, The Songwriter's Guild (Van der Graaf Generator, World Record)
These days I mainly just talk to plants and dogs
all human contact seems painful, risky, odd;
so I stay acting god in my own universe
where I trade cigarettes in return for songs.
The deal's made harder the longer I go on:
I find me gone from all but secret languages.
If only I could phrase satisfactory words
in conversation, to make my passion heard...
If only...
Meurglys III, he's my friend,
the only one that I can trust
to let it be without pretence
- there's no-one else.
It's killing me, but in the end
there's no-one else I know is true,
there's none in all the masks of men,
there's nothing else
but my guitar...
I suppose he'll have to do.
Talking in tongues is easy when you know how,
quite pleasing, but still nothing works out right.
Pressurised lungs, heart bleeding,
you'd better slow down
and show that you can make it through the night.
However dark it seems,
the present is just the present,
beyond it no further darness lies concealed
and through these desperate dreams,
this longing for friends and comfort,
you know that in the end all will be revealed.
When no more plants or dogs
or rooms are there to hear you,
and no-one is left near you, then you'll see:
in the end there's only you and Meurglys III,
and this is just what you chose to be,
fool!
Though I know all this is just escape,
I run because I don't know where the prison lies.
In songs like this I can bear the weight...
I'm running still,
I shall until,
one day, I hope that I'll arrive.
Inauguração das pesquisas
de óleo no sangue, e
hoje estacionou em frente ao prédio
o equipamento de sondagens.
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Home sweet home
aquele espaço de íntimas
palavras, a meio caminho
entre duas ilhargas,
bastou-lhe umas prateleiras
e ficou pernoitando na livraria.
quarta-feira, 1 de setembro de 2010
POESIA A SUL
aportada mais cedo
nos meus braços
choro
porque quero
que nunca me partas
assim o crepúsculo chegue
choro
porque um cheiro
silvestre de flores
nunca me parou assim
choro
porque ainda encontro
o macio das tuas mãos algodão
amimadas no meu peito
choro
e as lágrimas escarpadas
não são mais que espelho e oxigénio
tudo ainda mais vivo e a pele aquecida
afinal choro
nunca foi nada assim
in “Mar de Fora” - Henrique Graça – Lagos, 2010
P Ponte (Caldas da Rainha, 1 de Setembro 2010)
Também no blog poemas em azeite: Aqui
Sala de espera
de norte a sul,
não pares, nunca pares,
em cada passagem de nível
um guarda nocturno,
anota a velocidade,
na congestão das têmporas
no ritmo batuque de madeiras
Estações e apeadeiros,
transportando o quotidiano
sonolento das manhãs,
o rigor dos compassos
composição vazia,
quarteto para o fim
do tempo, messiaen,
um tempo de trabalhadores,
salpicando o cais,
sala de espera
da solidão operária.